terça-feira, 31 de março de 2009

PELES

- Nunca imaginei que esse dia ia chegar. Por gerações ganhamos a vida dessa forma. Por zeleléu in cobus!!!
- Querido, não adianta se sentir assim – falou isso, mas seu rosto magro, ossudo e cadavérico,a semelhança de seu marido e filho, não confirmavam suas palavras.
- Mãe, quero comer, quero sim. Oh, eu quero, minha mãezinha queridaaaaaa...
- Filho, fale com seu pai... eu... oh...
- Tamita, minha mulher, não se demore... não demore mais...
- O rosto de nosso filho, o corpo de nosso filho, oh, por zeleléu! Esta todo amarelo...
Chora copiosamente.
- Não demore mais- olha a sua volta, vislumbrando o barraco de madeira- laranja, com pouco mais que 16 metros quadrados, tendo como moveis apenas uma mesa e três cadeiras e duas esteiras. Uma grande, para dormir, e outra pequena, própria para o ritual rinuni, ambas feita na colônia estergóide de Manaus.
Desnecessário dizer mencionar que essa família, reliosamente fervorosa, de caçadores nunca sequer considerou a possibilidade de abandonar o sagrado culto ao deus Bichão, nem, menos ainda, abandonou o costume de reservar parte de suas peles à Igreja do Alto.
- Feche a janela, esta fazendo frio.
- Sim.
- Ortogon.
Sim?
- Nada, nada.
- Não fale mais nada, vamos.
- Vocês vão...?
- Sim, nós vamos.
- Aonde vamos, mamãe?
- Filho, sua mãe vão fazer uma viagem.
- Posso ir, mãe? Posso?
- Filho, sua mãe vai sozinha. - E vai demorar- pergunta isso e corre para a porta tentando impedir que sua mãe saia, ao que seu pai o arranca bruscamente do caminho. E ambos, pai e filho, em prantos, dirigem-se, em prantos, ao animal monstruoso que os aguarda raringando estericamente.

Nota: Muito já se questionou se o raringar, dos ameobitas, não seria a causa da surdez da maioria do povo caxita.

No caminho, a maior parte executada em sepulcral silêncio, Ortogan apenas resmunga – Por gerações, ganhamos a vida caçando e vendendo pele, carne e ossos de galinks. Até aceitamos essa mistura doida de galinks com cavalo. Cavalo! Zeleléu, que bicho mais esquisito esse! Mas agora... Porque esse eco-soldados não deixa a gente viver nossa vida em paz?

Nota 2: Pecuaristas texanos lograram o cruzamento genético do cavalo terrestre com o galink devezan.

Nota 3: Eco-soldados tem o direito, garantido pelo pacto cósmico de paz entre os estados soberanos de empreender força policial sobre aqueles que eles, por ventura, julgarem estar atentando contra o eco-pscicosistema de quaisquer planeta membro da União pelas Galáxias Livres.

Na pequena vila encontram o coveiro, que acumula a função de carteiro e padeiro, desde que o primeiro foi executado por eco-soldados e o segundo emigrou para a Via Láctea.
- Sujeitinho de coragem, ter se mandado pra Marte. Dizem que o Império Nipo-soviético não é melhor que os eco-soldados. O custo de vida lá é coisa muito ruim, zeleléu se não é.
- Deixe de bobagem, criatura. Não deixe de minha mulher mais desolada do que já esta.
- Nada pode me desanimar mais do que já tô. Deixe que ele fale. Que importa o que pensa um amante de humanas?
Ouvindo isso, o coveiro baixa suas grossas pestanas num desanimo de dar desgosto.
- Olhe, a nave já esta te esperando. Vamos ver se aquela humana gorda aceita o pagamento.
- A humana gorda aqui aceita sim – bufa impaciente a colossal mulher americana, e prossegue, após um longo e cansado suspirar – Já vim até aqui mesmo. E preciso pagar o combustível: Vou juntar essas peles com as outras e na Baixa Mir, troco por plutônio – a mulher, baixa, negra, com seus setenta e poucos anos, amarra a cara mais ainda e entra na nave e da instruções, num árabe arcaico, para seu navegador. Mas, por último, finaliza em taquisanês – My God, e arranco teus quatro braços, seu magricelo quatros olhos incopentente.
Parte a nave, com mais uma emigrante, deixando esperanças, pai e filho, na pequena vila de Urmur.





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